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segunda-feira, 26 de agosto de 2013

Padrões, Dança e Afins

Hoje andando pela internet me deparei com um artigo que explicava em detalhes a dieta pré-desfile de uma "angel" da Victoria's Secret. Algo que envolve uma semana de alimentação à base de líquidos e 12 horas sem ingerir sequer água. Quem quiser aprender pode ler o artigo aqui. Nem vou entrar na questão dos riscos aos quais essas moças se submetem por salários gordos e a perpetuação de um padrão de beleza caduco e impossível. E nem dos valores da nossa sociedade moderna.

Enfim, o que isso tudo tem a ver com a dança do ventre ou tribal? Tudo.

Por séculos a mulher foi considerada inferior, podada de qualquer autonomia sobre seu corpo, intelecto, e por aí vai. O mundo continua uma droga, mas em boa parte dele a mulher já conseguiu o direito de trabalhar, ter vida social, escolher o que quer fazer com seu corpo... Contanto que não escolha ter barriga (ninguém merece) ou pêlos no corpo (que nojo). Começa a ficar mais claro o que isso tem a ver com a dança? Estamos falando de uma dança milenar e essencialmente feminina (homens podem e devem praticar, mas não muda o fato de ser feminina em sua essência). Quem pratica sabe o impacto que ela causa na vida de uma pessoa - é uma dança de resgate, de autonomia e de liberdade. Dá poder. Quem não viu uma aluna que nunca teve coragem de mostrar a barriga levantando a blusa para visualizar melhor um movimento? E na hora da apresentação feliz da vida com a barriga de fora? É isso que essa dança faz com a mulher. Não é mentira, e quem conhece sabe! Agora, meu ponto principal é: porque não aproveitar essa característica inerente à dança e usá-la a nosso favor? Como? Não julgue a aparência das suas colegas. Não julgue a sua aparência. Seja de fato colega das suas colegas. Não é uma competição. Valorize-se. Valorize a dança. Se você é professora, faça com que suas alunas sintam-se boas, capazes, dê o exemplo. Quando dizemos coisas do tipo "esse brinco faz meu dedão do pé parecer gordo" não estamos nos valorizando. Estamos apenas reforçando o tipo de lixo que recebemos de forma maciça todos os dias ao abrir uma revista ou ligar a tv. Isso já tem de sobra. A mídia nos diz como deve ser nosso cabelo, nossa pele, nossas axilas(!)... Vamos fazer da dança nosso pequeno oásis, onde não importa se o quadril é 38 ou 48, mas sim a precisão com que ele faz a leitura musical. Sejamos a diferença, a contra-corrente. Capazes de nos aceitarmos, nos sentirmos bonitas como somos, e permitir que o outro também. É um treino constante e requer esforço. Mas, se ao menos no nosso minúsculo nicho conseguirmos nos livrar, só um pouquinho, desses padrões que nos escravizam, então vale a pena. É isso. Apenas um pouco de "food for thought".

Henri Matisse - The Dance, 1911

quarta-feira, 5 de junho de 2013

Cadê o tom?


Talvez o tempo tenha me deixado muito cricri, mas tenho assistido tantos vídeos recentemente (inclusive de bailarinas famosas) em que me surpreende a falta de um tom geral para a apresentação. Por exemplo: a apresentação começa com uma música dark, acompanhando uma encenação meio teatral, e 2 minutos depois entra um balkan animado finalizando com um solo de derbak. Tudo com figurino  de inspiração anos 20. ???? Não estou dizendo que sou contra uma apresentação dinâmica com momentos distintos, mas que esses momentos tenham ligação entre si, que fluam de maneira suave... Acho que isso se deve em grande parte ao "pode tudo" do Tribal Fusion, já que podemos misturar tudo então vamos nos jogar! E pode se jogar... É só pensar um pouquinho na performance como um todo, como uma unidade. Pelo menos eu, como espectadora, gosto de perceber uma história, uma evolução natural de fatores por trás da performance, gosto de ser levada pelo "enredo". Quando acontecem mudanças bruscas no tom, no estilo musical, na coreografia, fico meio perdida, dificulta para que eu entre no clima. E não é nada difícil prestar atenção à isso, é só observar alguns fatores simples: Tem alguma mudança brusca na música/estilo musical, ou as músicas evoluem de maneira fluída? O figurino combina com todas as passagens/fusões da música, ou só com os primeiros 2 minutos? Pensar nessas duas questões já ajuda muito para estabelecer uma uniformidade na performance, um clima geral... Acho isso tão importante! Vamos dançar coisas com pé e cabeça? :)

obs: foto de um dos filmes mais wtf de todos os tempos, em que o Arnold Schwarzenegger fica "grávido". Combina tanto para ilustrar minha expressão ao ver esse tipo de contraste no palco quanto para demonstrar o quanto wtf coisas mal pensadas podem ser, como esse filme (a imagem fala por si só!)

segunda-feira, 28 de novembro de 2011

Ribeirão e afins

Nesse fim de semana estive em Ribeirão Preto com o workshop "Tribal Aplicado à Dança do Ventre", organizado pela Rossana Mello, do Espaço La Luna. Gostaria de agradecer a Rossana, a Mariana e a Larissa por toda a atenção e carinho, foi tudo tão gostoso! É muito bom trabalhar com pessoas sérias e com amor pela arte, se todo mundo fosse assim no meio da dança, certamente estaríamos bem melhor encaminhadas :) Para quem quiser conhecer, o Espaço La Luna fica na Rua Lafaiete e é super inspirador!

Fora os agradecimentos, esse tema é sempre legal de explorar, pois sempre gera perguntas interessantes e permite que a gente desmistifique um pouquinho o tribal, mudando certos conceitos errôneos que ainda são super comuns... Além disso, adoro pensar num caminho inverso do tribal inspirar a dança do ventre, já que o oposto acontece o tempo todo. Acho que o tribal tem a acrescentar para as bailarinas de dv no sentido de enraizar mais, trabalhar mais o ventre propriamente dito e voltar um pouquinho às origens de dançar com pé no chão, lembrando um pouco de porque dança do ventre é chamada de, hum... do ventre! Sem contar na parte conceitual que muitas vezes acompanha as performances de tribal, permitindo que a gente busque além do óbvio pelas nossas inspirações. É muito bom ver o interesse das meninas e ir aos pouquinhos aumentando o alcance e o entendimento do estilo tribal. São oportunidades assim que fazem todo o resto valer a pena!

Muito obrigada meninas!










*O blog está devidamente decorado para o Natal, antes de ganhar sua "cara" nova para o ano que vem!

segunda-feira, 28 de fevereiro de 2011

Não chame de "calça harém", "bracelete escrava" e "meninas que dançam"- Por Carolena Nericcio

 Pintura Orientalista retratando um harém 

Esse texto foi publicado no Tribal Talk - The Voice of FatChance BellyDance e foi escrito em novembro de 2001. Acho ele simplesmente fantástico, as observações que ela faz são muito felizes e ele  mudou minha maneira de ver as coisas desde que o li há alguns anos atrás. Por isso resolvi traduzir para compartilhar, espero que tenha o mesmo significado para vocês!

"Quantas vezes já lhe perguntaram: 'É verdade que a dança do ventre nasceu como uma maneira das meninas do harém chamarem a atenção do sultão?' Se a sua resposta foi 'nunca', sinta-se abençoada, pois eu sinto como se me perguntassem isso o tempo todo.
Agora, eu lhes pergunto: se nós ocidentais, como sociedade, somos tão inclinados a eliminar linguajares preconceituosos, certificando-nos de que nosso discurso seja politicamente correto e garanta direitos iguais para todos, porque desfazemos todo esse 'bem' ao nos referirmos às dançarinas do ventre como 'meninas que dançam' e usam 'calça harém' e 'bracelete escrava'? Porque achamos que ser a 'favorita do sultão' é uma coisa boa?
Porque temos uma visão tendenciosa da história e dos direitos das mulheres (ou seja, dos direitos humanos). As referências a 'escrava' e 'menina' são bem fáceis de entender. Se você vai usar o conceito de 'bracelete escrava' para vender uma bijuteria, você pode usar também o apelido extinto - e igualmente ofensivo - quando referir-se a castanhas-do-pará*. E o termo transparente 'meninas que dançam' é obviamente uma maneira de enfraquecer a mulher delegando-lhe o papel de criança indefesa. A fantasia do harém é mais difícil de ilustrar, mas tentarei.
Tenho certeza de que nem todos compartilham minha opinião, mas talvez eu consiga explicar meu ponto de vista. Quando eu comecei a dançar e depois a ensinar dança, eu queria aprender absolutamente tudo sobre a dança do ventre. O que eu descobri (20-25 anos atrás) foi uma porção de livros sobre as mulheres do Oriente Médio e Norte da África, mas nada relevante sobre a dança do ventre. Então, eu me contentei em ler as entrelinhas e coletar informações. Parte daquelas informações se tornaram o estilo eclético que virou o Tribal Americano e a outra parte alimentou minha paixão pelo feminismo e pelos direitos das mulheres. Daquela cultura peguei os belos trajes, músicas, uso de cores e formas e apliquei-os na dança. Descartei os conceitos de falta de liberdade, casamento forçado, status inferior das crianças de sexo feminino e mutilação genital.
Eu li muitos livros que diziam coisas que eu não queria ouvir. Portanto, quando eu escuto a palavra 'harém' ser usada indiscriminadamente para descrever um estilo de calça que é solto e fluído, me irrita profundamente. Os haréns eram prisões das quais as mulheres não escapavam. Os haréns eram a única maneira de sobreviver em um mundo em que as mulheres 'respeitáveis' não podiam trabalhar para se sustentarem. Os haréns eram uma maneira do homem mostrar que ele tinha dinheiro suficiente para sustentar muitas esposas e igual número de filhos. Havia os haréns do palácio de Topkapi na Turquia onde um sultão mantinha centenas de esposas, mas a família estendida padrão também era um harém. E embora as liberdades e costumes mudem de um país para o outro, a idéia central é a mesma: mulheres são fracas e estúpidas e precisam dos homens para cuidar delas. As mulheres são cidadãs de segunda classe cuja principal função é ter filhos. Filhas são um fardo, por isso terminam em haréns. Famílias pobres com muitas filhas freqüentemente as vendiam ou davam para os haréns para que tivessem uma chance de sobreviver. Os eunucos que guardavam os haréns dos sultões muitas vezes eram homens pobres que se emasculavam para que pudessem sobreviver. 
As pinturas orientalistas que retratam haréns cheios de belas mulheres repousando em almofadas foram pintadas por homens que nunca viram o interior de um harém. Por mais belas que sejam, essas pinturas apresentam um ponto de vista distorcido. No mínimo, elas não retratam o tédio e a incapacidade de sair por livre-arbítrio. Pelo lado pior, o que elas não retratam é o tédio que leva à loucura e à pena de morte por tentar fugir. 
Apesar de muitas vezes serem bem instruídas, as mulheres do harém não podiam usar sua educação a seu favor ou tomar qualquer decisão sobre suas vidas. Ser 'a favorita do sultão' não significava ser apreciada por ser a melhor dançarina ou pelo rosto mais bonito. A 'favorita' era uma mulher que tinha percebido o fato irônico de que se usasse sua educação e beleza para tornar-se companhia constante do rei, ela teria uma boa chance de sobreviver se conseguisse dar à luz um filho. Significava que ela teria uma grande chance de sobreviver se seu filho conseguisse tornar-se o próximo sultão, pois a mãe do sultão era uma espécie de conselheira política. Mas essa sobrevivência seria curta, já que a corte inteira seria morta ou exilada quando o próximo sultão tomasse posse. 
Os haréns não eram lugares românticos cheios de dança e calças diáfanas. Como Fatema Mernissi reitera em seus livros, um harém é uma prisão. Não associemos isso à forma de arte que estamos apresentando."


*Nos EUA, recebem o nome de "Brazil nuts" e antigamente eram chamadas pelo apelido preconceituoso "dedos de negro".


Texto por Carolena Nericcio.  
Traduzido com autorização por Mariana Quadros.